Tem coisas que só acontecem com o Botafogo. E outras só com a Argentina.
Depois da greve do campo que gerou falta de carne argentina para os próprios argentinos e consequentes panelaços na Plaza de Mayo chegou a hora de mais um problema em menos de um mês: "el humo".
Sim, a fumaça que invadiu Buenos Aires e cidades vizinhas. E nao estamos falando de nenhuma seleçao jamaicana de visita à terras portenhas. O tal "humo" vem das propositais queimadas de várias pastagens ("pastizales") do solo nacional.
A prática é realizada todos os anos mas desta vez a fumaça fugiu do controle e foi levada pelo vento para a capital argentina. E, como sempre, a epidemia só é grave quando chega até a porta da nossa casa.
Mais uma vez todos os jornais e noticiários só têm uma notícia pra mostrar. Que "el humo" isto, que "el humo" aquilo. Entrevistas com motoristas de caminhoes, acidentes na estrada e, claro, milhares de criancinhas com problemas respiratórios lotando hospitais públicos. Já esquecido o assunto da greve do campo, soterrado pela fumaça.
E, entre trocadilhos e piadinhas usadas pelos jornalistas pra rir um pouco da desgraça, foi impossível nao lembrar da clássica frase do filme "Cien veces no debo". No clássico da comédia argentina o pai, Julio, grita "se me lleno la cocina de humoooo" quando descobre que a filha, Lydia - que até entao ele acreditava ser virgem e ingênua - está grávida.
Neste caso, nao foi só a cozinha que se encheu de fumaça. Acordei e parecia que estava num sonho ou em alguma cena do passado. Pois era assim que estava meu quarto e todo o resto da casa: exatamente como na estética usada pelo cinema ou pela tevê quando se esfumaça a cena para mostrar algo fora da realidade.
Na rua a neblina nao deixava ver mais de 100 metros à frente e algumas pessoas já usavam o acessório hospitalar que tampa o nariz e a boca e vai amarrado na nuca - esqueci o nome em português, aqui se chama "barbijo". Outros sorriam, achavam graça, comentavam. Talvez estivessem se sentindo um pouco londrinos com toda esta história e vivendo, sim, o sonho de todo argentino que é ser mais europeu.
E claro que se na quinta feira de manha o "barbijo" custava 50 centavos, no sábado já estava, na promoçao, sendo vendido por dois pesos. A moda, como sempre, sabe se valorizar.
Hoje, segunda feira, a fumaça parece estar finalmente indo embora. Mas nada que gere tranquilidade. É o começo de uma semana argentina novinha em folha e nunca se sabe o que pode estar nos esperando...